Criança, ainda muito novo, com uns sete
anos de idade. E lembro tudo como se tivesse ocorrido hoje! É incrível como
algumas passagens de nossa vida se tornam significativas a ponto de fixarem
pontos de memória, traços indeléveis. É claro que minha saudosa mãe deve ter
repetido a história para mim algumas vezes, mas é fato que o resultado
produzido foi muito bom e eu agradeço muito pela lição bem transmitida pelo meu
pai, Alberto Ribeiro da Silva (in memoriam).
Um dia em nossa casa de São José dos
Campos, entre nossas conversas o papai me perguntou:
- “João Ribeiro, quando você crescer em
que gostaria de trabalhar?”
E eu respondi sem pestanejar:
- “Quero ser engraxate, papai”.
E ele em seguida fez um gesto de
aprovação e disse que iria providenciar o material completo para que eu
aprendesse e aprimorasse o meu serviço como engraxate. Alguns dias mais tarde papai
retornou do trabalho com uma caixa daquelas que os engraxates usam. Não sei
como ele a conseguiu, se comprou ou se pediu para alguém fazer. Além daquele
equipamento vieram também acessórios completos, como flanelas, panos de
polimento, tintas, graxas de cores diferentes, escovas, enfim tudo o que um bom
engraxate utiliza. Felicidade total a minha, com o trabalho que ali se
iniciava. Devo ter engraxado os sapatos dele, não lembro direito, os meus e o
de meu tio Raimundo para treinar. E haja brilho! Os sapatos ficavam muito
caprichados, pelo zelo com que eu os tratava.
Muito bem: para melhorar ainda mais as
coisas o papai em outro dia chegou com uma sacola de pano, que para mim era bem
grande, contendo vários pares de sapatos de colegas da repartição que ele
trabalhava - o Departamento de Estradas de Rodagem de São José. Assim o
material para o serviço chegava às minhas mãos. Eu fiquei muito
o empolgado e
durante a semana trabalhei com afinco, limpando, pintando (se fosse preciso) e
engraxando todos aqueles sapatos, no sentido de que tudo ficasse muito bem
feito. Com o serviço pronto cheguei para o papai e entreguei para ele os
sapatos todos devidamente polidos e brilhando para serem devolvidos para seus
donos. Não sabia que estava fazendo aquilo por dinheiro ou nem tinha ideia
exata de uma cobrança pelo serviço executado. Fiz o melhor que pude, sem pensar
que ganharia alguma coisa. E o papai levou aqueles sapatos todos de volta para
seus colegas.
E assim as semanas foram se passando e
de vez em quando ele chegava do trabalho com mais sapatos e me entregava para
que eu os engraxasse. Até que um belo dia veio à grande surpresa: ele chegou do
trabalho, me chamou e disse, explicando calmamente tudo para mim. Falou mais ou
menos o seguinte:
- “João Ribeiro, olhe aqui o que
mandaram para você pelo serviço dos sapatos. E me mostrou um cheque em suas
mãos no valor de R$ 11.000,00 (onze mil cruzeiros). Hoje eu ainda tenho dúvidas
quanto ao real valor da importância paga, se onze cruzeiros ou onze mil
cruzeiros. Mas o principal é que o papai me disse: “Esse cheque é seu, para
comprar o que você precisar”. E o serviço que você fez foi muito importante!
Aliás, lembro de ter ficado a forte imagem do valor daquele trabalho por mim
executado, no sentido de que muitas atividades eram da mesma forma, todas
nobres. E que o trabalho deveria ser sempre exercido com dignidade e bem feito,
para que a pessoa tenha sucesso na vida.
Sei que passados sessenta anos e eu aqui
não poderia de deixar de mencionar para nossa família e para os amigos a
importância da educação em casa com relação ao valor do trabalho. Pautei a
minha vida inteira com base na mesma lição, aprendida em casa, de meu pai, e executada
em inúmeras funções que por contingência da vida tive que executar, todas com
muito gosto, como por exemplo: músico, fotógrafo, técnico em eletrônica,
produtor musical, sonoplasta, oficial de inteligência, professor de informática
no início da era tecnológica e escrevendo atualmente no Instituto Portal
Messejana, no Blog do João Ribeiro, no qual faço registros de nossos bons
momentos de vida e escrevo sobre temas variados.
Muito obrigado, meu pai Alberto Ribeiro,
por este exemplo e por esta grandiosa lição de vida!
Por João Ribeiro da Silva Neto, em novembro de 2018
Por João Ribeiro da Silva Neto, em novembro de 2018